Hoje, meus caros leitores, vou lhes falar sobre uma pessoa muito querida que viveu nesta terra somente 45 anos. Um companheiro de peregrina simplicidade, uma alma encantada que fez de sua vida uma prática de honestidade e correção.
Mas...vamos fazer diferente... permitam que eu também leia. Quem vai lhes narrar esta comovente história é a bela moça que vocês veem acima, na data feliz em que se tornou a Senhora Sileide de Senna Eyng, em Imbituba, no dia 21 de julho de 1973. Sílvia e eu tenente, casadinhos novos, mais o tenente Djalma Dimas Nascimento e a Margareth, também casadinhos novos, fomos ao enlace rodando num DKV Vemag. Chovia a cântaros, o que em nenhum momento amenizou a intensa felicidade que o tenente Celito e sua Sileide viviam.
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Primeiro dia de março de 1967, quando Celito e mais 23 colegas, eu de contrapeso, ingressamos na Polícia Militar catarinense. Ele passou a se apresentar como Aluno Oficial número sessenta e nove Eyng do CP-CFO (Curso Preparatório ao Curso de Formação de Oficiais).
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Passo agora a palavra para Sileide:
Celito Pedro Eyng nasceu na cidade de Forquilhinha, sul do Estado de Santa Catarina, uma colônia formada em sua maioria por descendentes alemães. Era 26 de Julho de 1948. Filho de Aloísio Eyng e Ida Loch Eyng, o segundo filho de uma família de doze irmãos, sete homens e cinco mulheres. Seus pais eram agricultores no cultivo do arroz irrigado e mais tarde milho, soja, batata, etc. Também trabalhavam com a pecuária leiteira e a suinocultura.
Incentivados pelos pais, todos os filhos procuraram estudar. Quase todos os homens foram para a Escola Agrícola de Camboriú. Vários fizeram curso superior.
Celito, em 1965, tendo terminado o Ginásio e o Curso Normal, trabalhou durante um ano como professor primário na localidade de Palmital, município paranaense de Marechal Cândido Rondon. No final de 1966, incentivado pelo conterrâneo capitão Pedro Martins Bernadino, veio a Florianópolis para se submeter ao Concurso para o Curso de Formação de Oficiais da PM catarinense. Foi aprovado.
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1968. Celito e o amigo Valmor Backes, também de Forquilhinha, posam para a posteridade. Backes viria a ser Comandante Geral da PMSC.
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Celito e eu nos conhecemos em 1971 através de uma, até então, namorada dele. Chamava-se Iracema e residia na pensão de uma senhora viúva, onde também fui morar. Esta pensão ficava no final da rua Crispim Mira, no centro de Florianópolis. Ele a conhecera em Canoinhas numa das suas viagens a serviço. Ela falava muito nele, tratando-o sempre como "o galego". Eu, particularmente, não gostava muito de homens loiros. Achava-o muito brancão.
Numa tarde de sábado Celito foi pela primeira vez à pensão visitá-la. Eu estava na janela quando ele chegou fardado. Logo deduzi que era o galego. Perguntou-me pela Iracema. Repondi com uma pergunta: Você é o galego? Ele, muito sério e meio sem jeito me respondeu: meu nome é Celito!
Fiquei quieta e fui chamar a namorada. Desde aquele momento, porém, começamos uma amizade. Eu os acompanhava de vez em quando, sgurando vela. Eram idas ao cinema, bailes... E eu também tinha minhas paqueras, pois gostava muito de dançar!
Filha de Imbituba, Santa Catarina, vim em 1969 para a capital cursar a Faculdade de Serviço Social na Universidade Federal do Estado. Quando o conheci estava no segundo ano da faculdade. Paralelamente, como tinha o Magistério, fui dar aulas numa Escola Reunida do bairro Carianos, perto do Aeroporto. No ano seguinte passei a dar aulas no Grupo Escolar Barreiros Filho, no centro, para adultos, gente mais humilde que frequentava o Mobral, um programa de alfabetização.
Seis meses se passaram e eu já tinha grande amizade com o Celito. Ele frequentava a pensão para namorar a Iracema. Todos nós juntos, com a presença da dona da pensão, assistíamos à novela "A Fábrica", com Juca de Oliveira e Araci Balabanian.
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05 de Maio de 1968, Clube 12 de Agosto em Floripa. Os alunos oficiais da turma de 1967 recebem o espadim, símbolo maior do cadete. Nossa madrinha foi esta moça alta e bonita que está à frente entre dois cavalarianos. Era miss Paraná e miss Brasil naquele ano. E nós atrás, todos bobos. Seu nome era Dilza. O Bitenco e eu tiramos uma foto com ela. Pudemos constatar tristes o quanto éramos baixinhos! Na verdade, ela é que era muito alta! Da esquerda para a direita: começa com metade de uma cabeça que não dá para identificar. Depois o Ademir Ferreira (já falecido), Djalma, Jair (já falecido), Beckhauser, Ib Silva, Gilberto, Roberto, Getúlio, Bitenco, Daniel, Antônio Valter, Chico e Alcides. A bandeira do cavalariano volta a atrapalhar, mas acho que atrás dela está o Moacir Abreu (já falecido) e mais um outro. Depois o Lourival, o Davi Hasse e finalmente o Celito na ponta direita.
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Sileide continua:
Para minha surpresa, Celito passou a me esperar na saída do Colégio onde eu dava aulas à noite. Já ficara até amigo da diretora, dona Cilene Gevaerd.
Um belo dia ela me chamou para tratar de um assunto sério. Pensei que fosse sobre meus alunos, mas ela começou: Sileide, tenho observado este moço que vem sempre aqui te buscar. Acho-o muito bom e penso que ele está interessado em você!
-- Imagina, dona Cilene! Ele namora uma colega da pensão. Somos muito amigos, só isso! Eu até nem gosto de homem loiro!...
Não sei se ela acreditou, mas na época eu estava paquerando um rapaz alto e moreno da Base Aérea.
Os dias foram passando, ele me buscando sempre, e eu o observando melhor. Senti claramente que meu coração começava a disparar quando ele vinha. E o pior é que a Iracema me dizia que o relacionamento deles estava cada vez mais frio e que ele falava muito de mim. A situação só piorava.
Uma noite, ao sair do colégio, lá chegou o Celito, agora acompanhado do amigo Valmor Backes, os dois num fusquinha. Parece que este veio para dar coragem ao amigo. Dona Cilene aproveitou a carona, já que morava perto da pensão. Quando chegamos eu disse para ele:
-- Entra! Vou chamar a Iracema!...
-- Não, não, respondeu ele rápido. -- Não tenho mais nada com ela!
A coisa estava realmente complicada, e o pior é que o meu coração já era dele. Finalmente ele me falou de seu amor. A própria dona da pensão passou a rejeitá-lo, dizendo que ele estava com uma e já queria se aproveitar da outra. Isso não impediu que ele falasse com ela e explicasse com franqueza que a única coisa que queria era ficar comigo.
E assim se passaram uns três meses. O interessante é que depois, quando nos casamos, a Iracema foi nossa testemunha! Ela casou com um militar da Base Aérea e foi residir na Bahia. O tempo se encarregou de pôr todas as coisas no seu lugar. Celito me queria e eu também o queria, e isso era só o que importava.!
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Jantar numa churrascaria do Estreito. 1968. Da esquerda para a direita: Ademir Ferreira, Celito, Backes, Ib Silva, Mendes e Bittencourt.
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Fui muito feliz com Celito. Desta união tivemos três filhas: Daniela, Patrícia e Sílvia, hoje com 35, 33 e 31 anos respectivamente. Nossa vida familiar sempre foi pautada no amor, respeito, disciplina e estudo. Nos nos curtimos muito como família. Passeamos bastante, moramos em Lages três anos e meio, pois Celito foi destacado para ser o comandante da Companhia de Polícia Militar daquela cidade. Deixou a sua marca administrando muito bem, fez grandes amigos. É lembrado até hoje com respeito e admiração.
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1968. Escola de Oficiais na Trindade. O ginete Celito, do Primeiro ano do CFO.
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Em Agosto de 1982, ainda trabalhando em Lages, Celito foi acometido de uma forte gripe. Após muitas consultas e exames, foi diagnosticado um linfoma na faringe. Começava aí uma grande luta dele pela vida!
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18 de Dezembro de 1970. Celito se forma e é declarado Aspirante-a-Oficial. Na foto ele, Jair Wolff e Moacir Antônio Abreu, todos já falecidos.
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05-12-1972. Celito e Sileide noivos, no baile da Engenharia.
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Julho de 1973. A lua de mel em Laguna.
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30-07-1975. Equipe de Futebol de salão vencedora do Torneio Comandante Dória. Em pé o técnico major Univaldo Correa, capitão Paulo Roberto F. de Freitas, segundo tenente Jairo Amaral (meu cunhado, irmão de Sílvia) e primeiro tenente Valmor Backes. Agachados o primeiro tenente Getúlio Correa, hoje juiz auditor da Justiça Militar, o goleiro primeiro tenente Celito e o primeiro tenente Valmir Lemos.
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1972. Formatura de Sileide. Serviço Social na Universidade Federal de Santa Catarina. Solenidade na Assembléia Legislativa.
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1974. Daniela, a filha mais velha, era fissurada no quepe do papai.
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1981. O capitão Celito na sua formatura no Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais. As filhas Patrícia (de azul) e Daniela.
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Julho de 1981. A família em Lages. Patrícia e Silvinha faziam aniversário em julho e eles aproveitavam para comemorar numa festa só.
Daniela, Silvinha no meio e Patrícia. Os papais sorridentes.
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Em 1981 o casal fez um passeio a Belo Horizonte. Celito foi escolhido o melhor companheiro da viagem, com direito à faixa.
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1986. Formatura de Celito em Direito na UFSC. À direita o colega hoje coronel na reserva Saulo Sousa.
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1986. A família feliz na missa de formatura do pai.
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Sileide continua:
Celito amava muito seu trabalho. Entre um tratamento de quimioterapia e um tratamento medicamentoso, ele sempre pedia alta e voltava ao quartel. Para ele em primeiro lugar a sua Polícia Militar. Eu às vezes o xingava, reclamando que estávamos sempre em segundo, até a sua saúde, mas ele dizia ser tudo isso passageiro e as coisas se colocariam no seu lugar.
Acredito profundamente que ele, com a sua coragem, fé e determinação, prolongou muito a sua vida minada pela doença. Buscava com muita fé e perseverança tratamentos formais e mesmo alternativos. Tudo o que fazia era para que passássemos mais tempo juntos.
Entre agosto de 1982 e até 11 de junho de 1993, quando ele faleceu, passamos muitos momentos difíceis e dolorosos em razão de sua doença.
Além de tudo, tínhamos a formação familiar e escolar de nossas três filhas, o trabalho dentro e fora do lar e tudo o mais que o cotidiano exige. Pesou muito o problema financeiro, pois diariamente tínhamos gastos com medicamentos, alimentação especial. Mas nada que o fardo para nós determinado não pudéssemos carregar.
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1992. Celito dançando com a filha Patrícia na festa dos seus quinze anos. Deus o levaria no ano seguinte.
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1989. A família passeando em Campos do Jordão.
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Celito trabalhou no Quartel do Comando Geral, na Segunda Seção do Estado Maior. Instrutor na Escola de Formação de Oficiais e Chefe do Serviço de Radiocomunicações da PM. Foi Comandante da Quarta Companhia de Policia Militar de Lages. Serviu no Centro de Ensino, onde se destacou como Chefe da Divisão Administrativa. Como Tenente Coronel foi para a Diretoria de Apoio Logístico, onde se reformou, pois a doença não permitiu mais que trabalhasse.
Foi promovido a Segundo Tenente em 05 de maio de 1972, a primeiro tenente em 1975, a capitão em 1978, a major em 1983 e a Tenente Coronel em 1989.
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Homenagens:
11-11-1999. Lages. Inauguração da Praça Ten Cel Celito Pedro Eyng. Era Comandante do Policiamento do Interior o Coronel Paulo Dellajustina.
1998. O Nono Batalhão de Polícia Militar de Criciúma recebe o nome de Batalhão Ten Cel Celito Pedro Eyng, pois a região é a em que ele nasceu.
1993 - Os formandos do Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais recebem o nome de Turma Ten Cel Celito Pedro Eyng.
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Sileide:
Finalizando, narro uma passagem que muito nos marcou e que se refere à sua mãe Ida, que já está com ele.
Dona Ida tinha uma irmã freira na Itália e sonhava visitá-la um dia. E foi exatamente naquele ano que ela recebeu o convite para ir. Pensou em não ir em razão da doença do filho, mas este não permitiu. Incentivou-a demais. Mesmo doente pesquisou preços de passagens aéreas. Ele vivia sua fase terminal e ambos estavam conscientes disso. Ela atndeu o pedido do filho. Os dois não se despediram, fazendo de conta que tudo estava bem. Ele brincou:
-- Vai, mãe, que na volta eu irei recebê-la com um tapete vermelho.
Ela o olhou, deu um abraço terno e saiu sem olhar para trás. Ele faleceu uma semana antes dela chegar!
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1989. O casal na festa de aniversário de 15 anos da filha Daniela.
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E assim aconteceu nossa história (termina Sileide), cheia de amor e emoções. Sempre nos emocionamos quando dele nos lembramos.
Hoje, fruto dessa história iniciada em 1971, temos três filhas, três genros e cinco netos.
Daniela é casada com Ernesto Luiz Renuncio e eles têm os filhos Pedro Luiz (6 anos) e Tiago (3 anos). Patrícia é casada com Ricardo Westphal.
Silvinha é esposa de Alexandre Alves Máximo e eles têm os filhos Matheus (6 anos) e os gêmeos João Pedro e Isadora Amábile, de 10 meses. Formamos uma família bonita e estruturada. E cremos que se somos assim, só podemos agradecer aos cuidados e bênçãos de nosso querido Celito, que nos protege do maravilhoso lugar em que se encontra.
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Obrigada Cel. Roberto por esta linda homenagem feita ao nosso pai, nosso grande amigo... É difícil ler e nao se emocionar. Ele marcou e ainda marca muito as nossas vidas.
ResponderUm grande abraço: Dani
SILEIDE E FAMILIARES..
ResponderQUE HISTÓRIA LINDA....
COM CERTEZA DEVE SER BEM GUARDADA...LEMBRADA E SEGUIR OS BONS EXEMPLOS DEIXADOS POR LE.
POUCO O CONHECI, MAS SEI DA EDUCAÇÃO QUE OS TIOS DERAM A TODA A FAMÍLIA.ESSE É NOSSO BEM MAIOR..
QUE DEUS NA SUA INFINITA BONDADE OS ABENÇOE SEMPRE
UM CARINHOSO ABRAÇO
MARLENE VESCOVI
Nossa, é um orgulho só ouvir essa história novamente, ainda mais com as palavras da mãe.
ResponderAssim como minha mãe, meu pai até hoje é um exemplo de vida para mim, onde muitas das sua virtudes como honestidade, perseveranca naquilo que fazia e queria, simplicidade, companheirismo, brincalhão...enfim, amigo, tenho como lições de vida a seguir.
Lamento muito meus filhos não tê-lo conhecido, para entender que tudo que falamos sobre ela é pouco, ele era muito mais...era especial.
Obrigado Cel Roberto por essa homenagem.
Abraços
Silvia (Silvinha - como ele mesmo me chamava)
O que temos para recordar deste irmão muito querido e estimado. A base de tudo foi a estrutura familiar de nossos pais. E o Celito seguiu e estruturou toda sua vida onde quer que estivesse. Em especial muito dedicada a sua familia e a profissão. Ele amou muito sua profissão. A familia, esposa e suas filhas eram tudo para ele, seu orgulho. Na verdade hoje relembrando estas que narram algumas passagens de sua vida nos reportam muito ao que convivemos juntos nos emocionam e temos certeza que valeu a pena a sua vida aqui na terra. Com toda sua dedicação, alegria e brincalhão como era. Ele hoje nos acompanha.
ResponderAgradeço ao Cel Roberto e a Sileide por esta homenagem e narrativa.
M.Helena Eyng
Leio emocionada a história de minha conterrânea e agora amiga Sileide. Este pequeno texto, nos revela que a vida pode ser bela, mesmo quando nesta caminhada, sofremos alguns desvios. Siga em frente com esta familia maravilhosa. Seja sempre muito feliz.
ResponderUm beijo
Albertina Brasiliense
Olá Roberto, (Celito Pedro EYNG, Jair Wolf, Abreu e todos outros amigos da Esfo e PMSC)...
Fiquei feliz em rever as fotos e o relato textual deste blog.
Via a foto dos três amigos que já se encontram nos páramos etéreos e eternos e muitas vezes estivemos juntos em nossa "mesa" quando CADETES da PMSC, na Trindade, em Florianópolis.
No Recanto das Letras, deixei registrado esta passagem: http://www.recantodasletras.com.br/artigos/962552
Muito bom relembrar e vivenciar nossa passagem terrena deixando nas letras e nas fotos nossa fugaz e célere transição nesta dimensão existencial.
Parabéns e FELICIDADES A TODOS!
www.laerciobeckhauser.com
Laércio Beckhauser
05 de Maio de 1968, Clube 12 de Agosto em Floripa. Os alunos oficiais da turma de 1967 recebem o espadim, símbolo maior do cadete. Nossa madrinha foi esta moça alta e bonita que está à frente entre dois cavalarianos. Era miss Paraná e miss Brasil naquele ano. E nós atrás, todos bobos. Seu nome era Dilza. O Bitenco e eu tiramos uma foto com ela. Pudemos constatar tristes o quanto éramos baixinhos! Na verdade, ela é que era muito alta! Da esquerda para a direita: começa com metade de uma cabeça que não dá para identificar. Depois o Ademir Ferreira (já falecido), Djalma, Jair (já falecido),Beckhauser, Ib Silva, Gilberto, Roberto, Getúlio, Bitenco, Daniel, Antônio Valter, Chico e Alcides. A bandeira do cavalariano volta a atrapalhar, mas acho que atrás dela está o Moacir Abreu (já falecido) e mais um outro. Depois o Lourival, o Davi Hasse e finalmente o Celito na ponta direita.
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